Um dia extraordinariamente comum. Seja bem-vindo senhor – (presidente)

Aqui em Coimbra já se faz sentir o prenúncio do inverno – levei agasalhos para o corpo e um livro para agasalhar o espírito. O primeiro foi útil, já o segundo desnecessário – estar em um lugar como o Convento Santa Clara traz calor a qualquer espírito. [Texto de Lu Lessa Ventarola]

Texto de Lu Lessa Ventarola


Exposição Campo Contracampo – José Pedro Croft
No Convento Santa Clara-a-Nova

Sexta-feira tranquila, 20 de novembro. Meu amigo Jorge Cabrera precisava apresentar um trabalho no Colégio das Artes e pediu-me para ficar para ele na exposição do José Pedro Croft, no Convento Santa Clara-a-Nova. Disse que sim.

Aqui em Coimbra já se faz sentir o prenúncio do inverno – levei agasalhos para o corpo e um livro para agasalhar o espírito. O primeiro foi útil, já o segundo desnecessário – estar em um lugar como o Convento Santa Clara traz calor a qualquer espírito. Durante a tarde algumas poucas pessoas subiram a ladeira e enfrentaram a estranheza do tempo pandêmico para darem aos seus olhos e pensamentos oportunidade de se exercitarem – e os habituais cumprimentos de recepção e despedida cuidaram para que o silêncio não reinasse absoluto. E quando não havia ninguém, do grande corredor, a linda e suave obra do Daniel Senise, feita para a terceira edição da Bienal Anozero, era como um sussurro a dizer que a arte costura os tempos.

Já era quase fim do dia quando entra um homem com passo confiante e voz simpática. Passa álcool gel nas mãos e fica por alguns minutos a ler o texto de curadoria que está na entrada, antes de visitar a obra – que se abriga no enorme salão do antigo refeitório do Convento. Na volta comenta suas impressões e despede-se com a mesma educação com que chegou. Antes de sair cuida de pegar um folheto da exposição para levar consigo.

Eu aperto o botão do marcador para registrar a presença deste homem, assim como fiz com os outros visitantes. Este homem que, como todos os outros, chegou – sem alarde, sem público, sem púlpito, sem fotos, sem assessores de imprensa, sem se fazer anunciar-, para dizer seu SIM à Cultura (e não é o mesmo que dizer que confia no futuro?).

Este homem era o senhor Presidente da República Portuguesa.

Posso desejar o mesmo para o Brasil? Posso e desejo –

Coimbra, 29 de novembro de 2020. Lu Lessa Ventarola.


Respostas a “Um dia extraordinariamente comum. Seja bem-vindo senhor – (presidente)”

  1. Rozane Oliveira

    O presidente português é um homem sensível, intelectual consistente. Realmente, como brasileira, desejo que, um dia o Brasil consiga um representante tão sério.

  2. Helena Ferraz Soares Lopes

    História maravilhosa que nos enche de esperança na humanidade . Mais ainda que texto lindo escrito com muita elegância, parabéns Lu. Amei.

  3. Helena Ferraz Soares Lopes

    História maravilhosa que nos enche de esperança na humanidade . Mais ainda que texto lindo escrito com muita elegância, parabéns Lu. Amei.

  4. Ana Tereza Oliveira

    Texto lindo, de uma leveza, uma delicadeza, que nos faz sentir toda a emoção do lugar, parabéns Lu!! Assim como minha irmã Rozane Oliveira, temos esperança de um Brasil melhor governado. Bjs

  5. Paulo Roberto Bérenger Alves Carneiro

    Ao final, quando você descobre que o homem era o Presidente da República, você é capaz de se impressionar pela humildade e simplicidade desse homem mas se você o acompanha no dia-a-dia da política portuguesa, não se surpreende porque esta é a maneira de agir deste excepcional Chefe de Estado. Gostaria muito que o Brasil um dia se espelhasse na nossa ex-metrópole.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *