Cinco poemas antigos e inéditos, de Toinho Castro

Os velhos versos, às vezes, é melhor deixá-los quietos. Às vezes não. Às vezes é preciso mexer neles. Não tirar a poeira, que a poeira neles, não sai. São já a própria poeira que os cobre. Os revisitamos pra reencontrar o que não mais existe, e acabamos por encontrar algo novo. Porque tudo se transforma. Quem, enfim, os escreveu, esses poemas? Eu? Um outro Eu? Há um outro que seja eu? Leio cada um deles não como quem os escreveu, e sim como quem os descobriu. Mas no final do dia, sou o responsável por eles.

— Toinho Castro


Agosto nos prometeu setembro
e sorrimos cheios de esperança.
Agosto que era feito de vento
e folhas ao vento.

Agosto nos deixou abraçados.
Agosto levou embora o mar
e disse que setembro o traria de volta.

Agosto agiu como
se não soubesse de nada,
como se tivesse esquecido
os nossos nomes.

E quando setembro chegasse
agosto não mais estaria aqui.
Agosto prometeu setembro
para o dia seguinte,
e foi embora enquanto dormíamos.

Agosto nos derrotou.


Não perturbem a tranquilidade
alcançada com tanta dor,
não inventem coisas para nos machucar.
Não vai adiantar.

Temos a floresta a nos esconder
e a nossa fuga interior,
temos um ao outro e podemos
escrever nossos nomes na areia
da praia.

Não tentem nos enganar,
que sobrevivemos.

A amargura está guardada
atrás de uma porta apenas
encostada,
e não olhamos para ela.


Minha cidade coberta de nuvem,
de dentro da minha lagoa.

Separo as grandes ondas das
ondas pequenas,
recolho os peixes antes que anoiteça
e durmo entre eles calmamente.

Deixo-me ficar triste como
uma velha árvore,
acolhido assim e agasalhado
entre os entes mais amados,
e guardando no fundo do coração
a espera, a carta escrita
e o caminho entre as águas.

A chuva não me deixa sozinho,
nem a montanha iluminada
para onde sigo.
E estou feliz com o frio do mar.


para roberval

Éramos parte das águas geladas
que agora, só agora, reconhecemos
ao invadi-las com esse barco.
Éramos como inseparáveis irmãos,
insuperáveis no amor um pelo outro
e de olhos esquecidos para o céu.

Que força enorme nos ergueu
e nos sonhou, entre tantas coisas
sonhadas,
que ondas tão altas a nos arremessar
para lá e para cá enquanto sorríamos.

Sorríamos porque havia vida em tudo,
e éramos parte das águas desse
mar gelado, que justo agora
cruzamos com nosso barco.

Sorríamos por aceitar o vento,
por percorrer o mundo,
e por sentir que lembraríamos de tudo.


Eu inventava árvores
e alimentava estrelas
porque sabia que virias.

Eu preparava os campos,
semeava portas e janelas
e sentava no terraço à tua espera.

E já era agosto, quase setembro,
quando a conta dos dias
se perdeu.