Se liga na Karou!

Entrevistada por Lorena Lacerda!

Lorena Lacerda, nossa colaboradora e aparceira de primeira linha, dá uma escapada da coluna Independência Poética pra trazer pra gente esse bate-papo com a baiana Karou, escritora, leitora crítica, preparadora de textos e ensino escrita criativa.

Bora ler!

O que te inspirou a começar a escrever?

Minha história com a escrita ironicamente começa de um jeito bem clichê: na infância. Desde que fui alfabetizada, escrevo livros e acredito que essa vocação veio juntamente com o incentivo à leitura, coisa que minha mãe sempre fez. E eu sempre escrevi sobre tudo o que mexe comigo, que me faz sentir e refletir: amores, tragédias, questões sociais, quem somos, de onde viemos, para onde vamos… A inspiração sempre esteve em todo lugar.

O que você faz quando percebe que está com bloqueio para novas poesias?

Costumo dizer que dentro da escrita criativa não existe bloqueio. Isso acontece porque tudo pode inspirar se a gente olhar da maneira correta. Além disso, com um pouco de planejamento e organização, aquela ideia guardada no fundo da gaveta pode se tornar um livro incrível. Como mentora de escrita, sempre ensino minhas alunas a importância de buscar novas referências para manter a mente ativa, criando e pensando, e, assim que a ideia surge, a gente já corre para planejar o livro inteirinho.

Seu maior sonho como escritor(a)?

Acredito que todo escritor sonhe em ver um livro sendo adaptado para as telonas e como alguém que ama muito cinema, eu adoraria ter essa experiência. Porém, não apenas ter o meu livro adaptado, mas sim estar na sala de roteiro, opinando, criando junto, acredito que esse processo criativo deve ser intenso e maravilhoso.

Assunto preferido de escrever?

Desde que desenvolvi a minha consciência racial/social, é urgente a minha necessidade de falar mais sobre esses temas, mas sempre da maneira mais curiosa possível. No meu primeiro livro, falei sobre a orfandade, principalmente sobre como ela aflige meninos negros, e a consequência disso ao longo da vida. Em outra história, dessa vez um conto, discuti a solidão do homem negro e gordo, mas claro, num Brasil distópico, pra a gente não perder o inusitado da escrita.

Um elogio para sua própria escrita?

Eu amo os meus personagens, talvez mais do que eu deveria. Acredito que minha bagagem no curso de psicologia não concluído me fez ver os personagens para além de uma representação, consigo criar pessoas com as quais nos identificamos, pessoas reais, que são sim heróis, mas não são perfeitos. Até hoje, amo psicologia e estudo sempre que posso, porque agrega muito na minha escrita.

Já publicou algum livro? Quais? Caso não, tem planos?

Sim! Tenho publicado o livro Entre Caixas, que conta a história de 4 órfãos criados numa fazenda por uma senhora um pouco macabra. O conto de natal Looping, que está dentro da antologia preta de natal 6 Desejos de Natal, organizada pela Roberta Gurriti e publicada pela Se Liga Editorial!. E, por último, mas não menos importante, o conto Onde As Estrelas não Brilham, que conta a história de João, um programador que precisa salvar um Brasil que o rejeita. Esse conto se passa no ano de 3.500. Espero que ainda esse mais, mais livros sejam publicados.

Quais inspirações do cotidiano despertam sua escrita?

Os temas que mais me abalam são os meus favoritos de escrever. Comecei escrevendo Crime e até hoje me arrisco. Quando percebo em que pé estamos como sociedade, me sinto na obrigação de escrever algo que mostre a potência e a grandiosidade dos meus. E não me refiro apenas a mulheres negras, sou atravessada o tempo inteiro por minhas interseccionalidades e por temas que também tocam as pessoas que convivo e amo.

Qual dos seus poemas mais te define?

O livro que mais me define, sem dúvidas, é Entre Caixas. Por mais bizarro que isso possa parecer (e quem leu ele sabe a que estou me referindo) ele foi um livro que escrevi muito nova, sem pensar tanto no julgamento alheio, sem ter essa quantidade de seguidores, quando poucos da minha família sabiam que eu escrevia. Hoje, são tantos olhares sobre mim que me pego podando o que estou fazendo por medo de ser incompreendida ou até mesmo “cancelada”. Não que eu escreva algo “cancelável”, mas como uma mulher negra que possui certa visibilidade, procuro não dar margem para más interpretações.

Qual a parte mais fácil e mais difícil da escrita para você?

A mais fácil com certeza é a de criar. Pensar na história, desenvolver os personagens, pesquisar aparências, qual história vão contar. Eu amo planejar um livro. A mais difícil, com certeza, é escrever. Todo mundo tem manias e eu tenho várias, principalmente na hora da escrita. Preciso de silêncio absoluto e um final de semana inteiro sentada à mesa para escrever uma história de uma vez só, coisa que hoje é bastante difícil de conseguir. Por isso, escrevo aos poucos, um pouco a cada dia e por mais que seja ótimo para manter o hábito da escrita e se manter conectada com a história, não é a minha maneira favorita que fazer isso.

Qual sua obra favorita de outro autor(a)?

Essa é a pergunta mais difícil de responder. Já tive tantos livros como favoritos, tudo depende bastante da fase em que eu estou. Hoje, vou dizer que é O Beijo do Rio, do Stefano Volp, por ser um livro de mistério (gênero que amo) no qual me identifiquei bastante com o protagonista. A história é super fluida, deixa a gente curioso e o melhor, é de um autor super querido.

 


Um livro da Karou!

Nome da obra?

Onde As Estrelas Não Brilham

Quando e em qual editora foi publicada?

Publiquei de maneira independente.

Existe um tema central nos seus poemas/poesias? Qual?

Todos possuem um recorte racial muito forte. Nessa história, por exemplo, existem apenas pessoas negras. Para compreender o texto, é claro, é preciso ler o conto. Quando estava planejando o universo da história pensei: o que aconteceria se o racismo não existisse? E a partir daí passei a desenvolver todo o resto

O que te incentivou a escrever esse livro?

Vi uma thread no Twitter de um rapaz falando sobre como é difícil para um homem negro e gordo no Brasil encontrar e manter relacionamentos românticos e fiquei super mexida com o assunto. Em poucos dias pensei na história e escrevi.

Existe algum posicionamento político ou cultural na obra?

Definitivamente sim. Tudo está nas entrelinhas.

Qual a relevância dos personagens implícitos/explícitos da obra?

Nessa história, temos João, o protagonista, um programador que foi abandonado pela mulher que amava, Carla, e não se sente mais capaz de ser ou fazer nada. Também temos Rita, uma programadora inteligentíssima, forte e muito amorosa, que trabalha muito para conseguir o seu lugar às estrelas e não deixa que ninguém tome o seu lugar. A interação entre esses dois é belíssima e muito potente. Juntos eles mostram que ser quem é não te impede de absolutamente nada, você pode sim salvar o mundo, você pode sim encontrar o amor. É inspirador, modéstia à parte.

Qual a poesia mais marcante desse livro?

Tem uma frase que os personagens repetem na história que diz muito sobre mim também. Tem uma importância que já conhecemos e fez muito sentido dentro do contexto da história. Eles sempre olham um para o outro e dizem: “Eu sou porque nós somos”.

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