Dizer meu bem Revista Kuruma'tá, 10 de julho de 202322 de novembro de 2024 Texto de Toinho Castro Ilustração de Edmundo Rodrigues, para o livro A ilha perdida, de Maria José Dupré “Meu bem”, que coisa linda de se dizer a alguém. Fiz esse quase poema meio sem querer, ou talvez porque com “meu bem” não reste nada a dizer além da poesia. Outro dia de manhã, na padaria, a moça atrás do balcão me falou assim: Vai querer o que, meu bem? De repente ela pareceu-me cheia de magia, de poderes, coo se pudesse realizar sonhos antigos. Quase que eu digo: quero ser astronauta. Voar até a lua. Quero ter um submarino. Quero ter vivido a história de A ilha perdida, de Maria José Dupré. Tal é o poder do “meu bem” quando a gente o escuta, vindo de alguém. Conformei-me com média e pão na chapa. Mas certamente carregados de algo bom, que não sei o que. “Meu bem” é mais bonito que “meu amor”, que tem, talvez, algo de impositivo, de definitivo. E ao mesmo tempo pede algo, quase exige um posicionamento. Algo de filma americano com final feliz, a muito custo desenhado pelos roteiristas. “Meu bem” é de uma leveza, de uma finura. Você pode ouvir, sorrir e mexer o café no balcão da padaria. E sua vida vai seguir. Parece sempre que logo depois a gente vai ouvir uma promessa, uma jura. “Meu amor” fecha uma porta. “Meu bem” abre janelas, areja a sala. Chama você pra entrar e se fazer de casa. Parece casual e displicente. Por isso, real. Talvez você ache que estou viajando, delirando, jogando assunto fora. Não, meu bem. Sei muito bem o que estou a dizer. Quando escuto um “meu bem”, mesmo que nem seja pra mim, aposto num dia bom. Mesmo que não seja pra mim. Crônica CrônicaLeitura