Poemas de Nina Camargo Revista Kuruma'tá, 23 de novembro de 202223 de novembro de 2022 Inbox da Kuruma’tá à todo vapor! Bem-vinda, Nina Camargo, às águas da Kuruma’tá, com sua poesia destemida e jovem. A nós muito alegra receber talentos como o seu e compartilhar força assim. Caiçara de Ilhabela, Nina reside em São Paulo, e sua voz fala com gente de toda parte que quiser ouvir. “Eu me pergunto”, diz Nina nos seus versos, nesse mundo de homens e violência e opressão. Se perguntar é subversivo. sobreviver é histeria o que é mais feminino do que ser forçada a ficar sozinhao que é mais feminino do que não ser capaz de se ver sozinhao que é mais feminino do que ter medo de ficar sozinhao que é mais feminino do que querer – e não conseguir – estar sozinhao que é mais feminino do que sobreviver o que é mais feminino do que não morrer de raiva porque ensinar já virou rotinaporque cuidar já virou rotinaporque pedir desculpas já virou rotina o que é mais feminino do que competir por uma vida que não quer porque nasceu ou se descobriu mulherporque querer ser mulher é fraquezaporque não ser mulher, mas acharem que você parece mulher, é fraqueza o que é mais feminino do que não ser suficientemente mulhero que é mais feminino do que não ser suficiente quando penso em quantas vezes mascarei a compulsão com o fumo quando penso em quantas vezes cobri o seio para não fechar o punho quando penso em quantos deles se sentaram ao meu lado sem assunto eu me pergunto o que é mais feminino do que o silêncioo que é mais feminino do que gritar e te mandarem fazer silêncioo que é mais feminino do que não pedir socorro e te perguntarem mas por que é que você fez silêncio mãos abanando nunca toquei as linhas tênues do teu rostoe as sinto lamber as linhas da minha palmacomo se trocassem teorias, gracejos, lágrimascomo se algo nessa troca fosse mais que esboço entre agonias, subentendidos e pressupostos encaixei-o em fantasias tolascomo se alguma delas fosse mais que tosca como se algo nelas fosse um pouco nosso ouvi as tuas músicas de novo nunca ouvi tua voz assim tão pertocomo se algo aqui fosse concretocomo se nenhum fragmento estivesse solto ah, meu bem, conte-me: quando, afinal, você vem? quando, afinal, você vai embora?quando compreendo que, sem demora, eu já deveria ter fugido, também? brinco aqui com esboços de rostosbrinco aqui com linhas tênues de pressupostos as mesmas músicas velhas de novoa mesma leveza do que não é nosso ainda assim, meu bem, eu sufocopor engrandecer o que não compreendopor sentir o encontro na passagem do tempopor sentir o tempo na passagem do encontro qualquer dia, meu bem, isso passa dessa vez, quando choro, é sem pesonão sinto medo do depois que desconheçoe o que conheço agora já me transpassa bons tratos e mariposas fugir da dor de cabeça três vezes em uma terça, debruçar-se na mesa torta, odiar o formato da boca. escrever em silêncio escondida do sol,odiar o ministro, tentar ser mais boba. fazer-me de sonsa cinco vezes até quinta, ter preguiça de justificativas e de moscas. ter a impressão de não ser tão sensívelpor gostar de ser bons tratos e de mariposas. impor uns limites aqui e acolá, nem todos muito justos, mas há de se reconhecer a coragem do intento.ainda não saber o que gosta de si, o que gosta da vida;ser indecisa, ingênua e não saber abraçar o contentamento. há um longo caminho até se parecer consigo mesmo;há camadas impostas o bastante para que se viva abrindo janelas. antes da segurança e da certeza, portanto,esqueçamos um pouco o reconhecimentoe passemos a enxergar a beleza das frestas. Nina Camargo tem 21 anos e é pedagoga, estudante de História da Arte e poeta. É caiçara de Ilhabela, mas mora em São Paulo. Ama gatinhos, crianças, padarias e livros de fantasia. Em seu Instagram, @iapoes, compartilha poemas inspirados em obras de arte e experiências cotidianas. A CaiçaraFeminismoIlhabelaLeia MulheresLeituraPoesia