Eu amo a L&PM

Texto de Toinho Castro


A gente, que gosta de livro, quando encontra alguém que também gosta de livro, se dana a falar sobre nossas preferências de autores, ou a obra que mais marcou ou sobre nossas listas de livros por ler o já lidos. São temas inevitáveis, que rendem muitas conversas e essa coisa deliciosa que é a descoberta das afinidades. A emoção sutil de encontrar alguém com quem compartilhar esse amor pela literatura, e poder sugerir um livro.

Mas, e as editoras? Vamos conversar sobre as editoras, que são essas casas que dão saída aos livros, que materializam num objeto singular o trabalho de autores, designers, tradutores, revisores, editores e tantos profissionais que se envolvem nesse sonho.

Pois, queria dizer que tem essa editora que eu amo.

Meus pais cuidaram que eu tivesse a educação adequada, e me educaram para que eu sempre procurasse por mais. E esse mais estava nas livrarias, nos sebos, nas mãos de amigos prestimosos, que me apresentaram a muita coisa que funcionou como uma escola paralela, enriquecendo meu cotidiano, trazendo sentido onde não havia e criando confusão quando necessário.

Quando comecei a me torna isso que posso chamar de leitor, eu lia sem noção da existência das editoras. Eu lia livros. Até que comecei a notar padrões, livros que quando reunidos tinham uma liga, uma mensagem, uma história. A história de quem os editou! Lá estava a editora, bem sob meu nariz… ou meus olhos. E de repente eu já não procurava por títulos ou autores somente. Procurava por editoras.

E foi aí que encontrei a L&PM. E gente, como eu amo a L&PM.

Dos esforços reunidos dos jovens Paulo de Almeida Lima e Ivan Pinheiro Machado, nasce a L&PM, em 1974, na cidade de Porto Alegre. Oito anos mais nova que eu, falta pouco para a editora completar 50 anos. São quase 50 anos direto na veia da leitorada brasileira, lançando livros com sagacidade e inteligência. Nossa, como li, e ainda leio, os livros da L&PM!

Bom larguei o jornalismo pra não ter que levantar dados ou biografias. Então vamos falar de amor… Devo a essa editora corajosa toda uma educação para a leitura, a literatura e a poesia. Foi em suas páginas que dei com o Uivo, de Allen Ginsberg, numa edição de 1984, com tradução de Claudio Willer. De Ginsberg para Lawrence Ferlinghetti e o mundo da poesia beatnik. Uivo foi uma espécie de portal mágico, e o mundo que então se abria era o da L&PM.

Li tantos autores, de perder a conta… Bukowski, Edgar Alan Poe, García Lorca, John Fante, Florbela Espanca. E li muito porque os livros era baratos… acho que a L&PM tem a maior coleção de livros de bolso do Brasil. Creio que sejam centenas de títulos. De acordo com o site da editora, são quase 1400 títulos, a preços bem camaradas. Todo livro tinha que ter uma versão de bolso!

A L&PM me veio assim tão forte à lembrança, porque comprei uma edição de Verdes vales do fim do mundo, biografia das andanças do Antônio Bivar pela Europa, nos anos 70. Meu exemplar comprado na Livro 7, no Recife, lá em 1985 ou 1986, sumiu com as mudanças, na mão de alguma amizade. Então vi ontem uma promoção na internet e não resisti. Amanhã terei novamente esse livro delicioso do Bivar nas minhas mãos e vai ser um reencontro e tanto. Daqui de onde escrevo esse texto, vejo na estante uns volumes pequenos da L&PM, aos quais sempre recorro. Já disse que amo a L&PM?!

Outro dia, conversando com o Aderaldo Luciano, falamos da L&PM, da importância dela pra gente, pra nossa formação como leitores e escritores. Como gente, né?! Falamos dos livros singulares, que reviraram nossos pensamentos e encheram as nossas cabeças de ideias. Ler aqueles livros dava vontade de escrever. Uma vontade que não passa.

Lembro de, já no Rio de Janeiro, sentar na areia do Leblon, num fim de tarde, e abrir aquela velha edição de Uivo, comprada também na Livro 7. A luz já ficando meio mortiça e eu insistindo em enxergar aqueles versos, enquanto acendia o Hotel Marina às minhas costas, e eu pensando, comovido, em como que alguém havia resolvido lançar, aqui no Brasil, aquele livro que havia mudado minha vida.



E não esquecer jamais que perdemos o Antônio Bivar para A Covid-19, em 5 de julho de 2020