Geno e seus pintos

Texto de Eduardo Maciel


Olá, kurumateires amades!

Vim contar uma história pra vocês…

Era uma vez um senhor de meia idade, de nome Geno Syda. Apesar de sua pouca inteligência e atitudes duvidosas, Geno era um homem patriota. Na cabeça dele ele era. Ele podia fazer tudo em dissonância, mas naqueles muitos momentos em que se detinha, mais demoradamente que o esperado, em frente ao espelho, ele poderia chorar jurando seu patriotismo.

De gado, ele entendia muito. Muito mesmo. Era inclusive chamado de Rei do Gado na época da novela, reparem que pândego!

Ai ai… Esse Sr. Geno… Secretamente nutria uma paixão ainda maior do que pelo gado e seu título de Rei: ele amava pintos!

Gente, por favor não me levem a mal! Quando falo pinto, não tem nada fálico aqui! Juro. Até porque se Geno vier aqui para ler esse texto e suspeitar que estou a duvidar de sua masculinidade bruta é capaz de eu levar um tiro de fuzil na cabeça.

Não contei ainda? Então. Geno é além de tudo um colecionador de armas pesadas, porque pra ele um povo armado nunca será escravizado. Enfim… Deixa eu voltar pro pinto…

Esse amor de Geno por pintos sempre foi algo secreto, como eu disse. Ele adorava a cor amarela dos pintos, aquele amarelo tipo o da camisa da seleção brasileira de futebol, sabe?

Mas o segredinho ruiu quando ele resolveu comprar uns pintos na feira livre, que acontecia periodicamente. Foi lá, comprou um montão de pintos e os numerou, chamando cada um pelo seu respectivo número. Que graça!

Ele todos os dias ia lá no cercadinho dos pintos, os alimentava, e chegava até a conversar com eles! Pitoresco.

É claro que, com tanto pinto, muitos se aventuravam a sair do cercadinho. Esses, pro Geno, eram pintos rebeldes: como ousariam contrariar seus mandamentos? Enfim. Por mais que ele tentasse, não conseguia controlar essa rebeldia toda.

Certa vez, amanheceu o dia da Independência do Brasil. Geno acordou animado, muito animado. Afinal ele se achava um patriota, vocês lembram?

Acordou, vestiu sua melhor roupa e foi passear em seu Volkswagen conversível, para ver a movimentação na rua. Seguiu logo pro local onde seus amigos se encontram, pra sentir maior pertencimento.

Depois do passeio, voltou pra casa e começou a beber pra comemorar. Bebeu e bebeu. Comemorou bastante! E, é claro, ficou embriagado, mais do que sempre tivera sido mesmo sóbrio.

Vários dos seus pintos rebeldes, que tinham deixado o cercadinho sem a autorização de Geno, estavam espalhados pela casa, a piar. Piando forte.

Alguns estavam em cima do sofá, no mesmo lugar em que se deixou deitar o corpo ébrio de Geno. Ele deitou sobre os pintos e imediatamente adormeceu.

Seus sonhos não eram sonhos quaisquer. Eram devaneios! E neles, Geno ouvia (dessa vez nem tão marcadamente) um piar ao fundo. Um piar cada vez mais sufocado, engasgado e soterrado. Geno se sentia feliz, por fazer calar (ao menos em seu assim chamado sonho) aqueles pintos rebeldes. Ah, que sonho! Puro sonho!

Ele acorda. Se levanta e, ressacado de tantos estímulos excessivos da véspera, olha para o sofá.

Imediatamente percebe os pintos mortos. Se espanta, pois no sonho ele achava que eram menos pintos no sofá. Que prejuízo, ele pensa. Mas logo destorce o pensamento, no afago interno trazido pela constatação de que ele precisaria alimentar menos pintos, e a economia nas finanças sempre seria mais importante do que o prejuízo com a morte de pintos. Principalmente os rebeldes.

Satisfeito, vai lá cumprir sua rotina, a de dar de comer aos pintos do cercado.

Mas eles não estavam mais lá.

Nenhum deles estava.

É que todos ouviram e viram bem claramente como o dono deles, Geno Syda, foi negligente e agressivo com os pintos rebeldes. E se rebelaram todos.

Quanto a Geno, sem ter mais nenhum pinto pra chamar de seu, restou aquela sensação de fracasso. Dela ele jamais se recuperou. O que já era de se esperar. Afinal, ele era mesmo irrecuperável!