A poesia de Fabiano Silmes

Fabiano Silmes, poeta de São Gonçalo, entusiasta do underground e da literatura marginal, chegando na Kuruma’tá e fazendo valer o nosso inbox mágico com a qualidade pungente de sua poesia. Seja bem-vindo, Fabiano!


UM POEMA PARA JACK

deitado numa velha rodoviária
tremendo de frio sob o céu
cravejado de estrelas
(ursa maior cruzeiro do sul…)

perdi o ônibus
perdi as moedas pro cigarro
perdi o rumo de casa
perdi até o sono

perdi quase tudo nessa vida
mas nem tudo está perdido
eu ainda estou aqui, firme

esperando outro ônibus
que me levará em segurança
para algum lugar calmo
depois das montanhas

perto do sol, na luz da manhã.


FLUX

o sol faz ver
quem olha o sol
não vê nada
com lente escura
dá para
olhar e ver
escurecer o olho
dentro do olho
e o sol brilhar
escuro o cu é
uma
palavra
pequena e ao
mesmo tempo
palavrão
a cigarra não
fuma cigarro
o cigarro fuma
pulmão
a mente sabe
o que sentimos
ela faz a gente
sentir o que
sentimos quando
sentimos o que
ela quer mas
todo mundo diz
que o culpado é
o coração
que é um
músculo
que bate no peito
dizendo
que não é
o culpado não.


ESFINGES MIDIÁTICAS

aceite inerte
pálidos agrados
áridos falidos
movimentos
em postos nus
nos arredores do nada
e não reclame
pelo enxame
de promessas
não cumpridas
mastigue-as apenas
e continue sorrindo para a TV.


SEGUNDO PLANO

tiros y bombas y sangue y lágrimas
a mídia que filmava editou a imagem
como que corta uma cebola e chora
sem sentimento algum o alvoroço
das reivindicações do povo acuado

diante das lentes a tv filmou mas
não registrou cortou e mostrou outra cena
o grande milagre da televisão brasileira
é a possibilidade de colocar a verdade
sempre em segundo plano.


POEMA PARA NÓS DOIS

curioso é colocar voz nos versos
bastante silêncio nas palavras
consertar os erros que sequer
sabíamos erros quando errávamos
por aí, incautos, mundo à fora
deserto aqui dentro – sempre- um
pensamento me consola enquanto
outro me consome lentamente
como um cigarro aceso ao acaso
dos instantes entre a pressa cega de
seguir e dessa vontade louca de
ficar olhando você dormindo, rindo
quem sabe sonhando comigo indo
te encontrar nos teus sonhos.


Fabiano Silmes nasceu em São Gonçalo, Rio de Janeiro. Publicou Comida para Bicho-cabeça em 2011, editora Multifoco. Entusiasta do underground e da literatura marginal, costuma postar poemas e crônicas em sua página no Facebook e também em blogs e revistas literárias.