Independência Poética: Giulia Amendola

Independência Poética é uma série de entrevistas realizadas por LORENA LACERDA

Poeta de hoje: Giulia Amendola

Nascida no Rio de Janeiro, Giulia Amendola é jornalista e trabalha como assessora de comunicação. Sempre soube que queria viver escrevendo. Aliás, faz isso desde que se entende por gente, primeiro através de diários, depois através de ficção pré-adolescente impublicável e, depois de adulta, através de poesias.

O que te inspirou a começar a escrever?

Primeiro, porque eu simplesmente precisava. Escrever se tornou uma ação fundamental para os meus dias, como se fosse uma válvula de escape, tanto para as coisas boas, quanto para as ruins. O pouco que eu lembro da minha vida sem escrever é quando eu ainda não sabia fazer isso de fato. [risos]

O que você faz quando percebe que está com bloqueio para novas poesias?

Antes, eu me angustiava muito com isso. Hoje, entendo que é parte de um processo maior do que eu, muito ligado ao contexto do momento que estou vivendo. Meu bloqueio particularmente não tem a ver com falta de inspiração em si, mas sim com falta de tempo, o que me gera ansiedade. Daí a angústia e a falta de palavra na ponta da caneta. Pra mim, a escrita é um exercício diário, tanto quanto uma atividade física. Se tenho tempo, faço até quando não tenho vontade, pra não enferrujar. Este hábito foi primordial para que o carapuça nascesse.

Seu maior sonho como escritor(a)?

Eu acho que o meu maior sonho como escritora, até então, era lançar um livro físico. Agora que fiz isso, meu sonho é atingir leitores em diferentes cidades, pessoas fora do meu eixo comum.

Assunto preferido de escrever?

O cotidiano, as miudezas do dia a dia. A comida que a gente come, a poça que a gente pisa sem querer.

Um elogio para sua própria escrita?

Acho que a minha escrita é um respiro. E num mundo tão corrido, é importante lembrar de respirar (nem que esse lembrete sirva somente para mim).

Já publicou algum livro? Quais? Caso não, tem planos?

Sim, lancei o livro de poesias carapuça em janeiro de 2023. Está na segunda tiragem. Já foi enviado para mais de 15 cidades, mais de 4 países diferentes. É muito melhor do que eu jamais imaginei.

O carapuça reúne escritos dos últimos 10 anos, mas principalmente do que criei nos últimos três. São poemas que falam sobre amores, corações partidos e perdas, mas acho que, se desse para resumi-lo, acho que ele fala sobre esse processo louco que é se tornar adulto – e entender nosso lugar no mundo.

Quais inspirações do cotidiano despertam sua escrita?

Qualquer coisa pode ser um “gatilho” para minha escrita. Algo que alguém me diz no trabalho, o latido diferente do meu cachorro, uma comida que comi, alguém que vi no ponto de ônibus, uma letra de uma música, uma história que alguém me contou. O ouvido fica atento a qualquer pequeno detalhe.

Qual dos seus poemas mais te define?

Sem dúvida alguma, “é de júpiter”, que escrevi em 2014 e está no meu livro.

“sábio foi alguém que uma vez disse
que a liberdade também aprisiona
porque o ser humano está preso em sua própria inércia
e por mais que se ache livre,
toda vez que estiver frente
a mais de uma opção
se corroerá na (in)decisão

posso enumerar
todas as coisas
que pensei que poderia ser:
achava, aos quatro,
que tocaria violão aos quinze.
com cinco, analfabeta
pensei que um dia leria
todos os livros da biblioteca da minha escola
e seis anos depois, achava que aos vinte,
que nem rimbaud,
já teria escrito duas das minhas obras primas.

é bem verdade
que nada me impediu
mas é que o século xxi me convenceu
que falta tempo.

eu queria é ser de júpiter
não conhecer as palavras, os discos
nem você.
queria ser de júpiter
aquele furacão famoso que dá para ver da superfície
a 10 mil anos-luz
queria ser de júpiter
ser tempestuoso e ainda assim atrair até luas;
queria ser de júpiter
ser conhecida
e não conhecer.

Qual a parte mais fácil e mais difícil da escrita para você?

A parte mais fácil é buscar inspiração nos pequenos detalhes, nos retalhos da vida. Já a mais difícil é a exposição, o processo do julgamento. É daí que vem o nome do livro, inclusive. É claro que todo autor quer que os leitores se identifiquem de alguma forma com a sua obra, com os seus escritos. Mas eu morria de medo de que alguém tomasse as dores do que leu nas minhas palavras. Com o tempo, decidi que isso não podia mais me paralisar, muito pelo contrário: se a carapuça ia servir a alguém, que fosse.

Qual sua obra favorita de outro autor(a)?

Neste momento, só consigo pensar em “Corpo Desfeito” da Jarid Arraes e em “A pequena coreografia do adeus”, da Aline Bei.

 


Um livro de Giulia Amendola

Nome da obra?

carapuça.

Quando e em qual editora foi publicada?

Janeiro de 2023, de forma independente.

Existe um tema central nos seus poemas/poesias? Qual?

É uma mistura do que a gente passa quando vai entrando na vida adulta… as angústias de reconhecer responsabilidades inadiáveis, de inícios e fins de relacionamento, o luto de perder entes queridos.

As poesias são divididas em fases nessa obra?

Não são…

O que te incentivou a escrever esse livro?

O que me incentivou a escrever carapuça, sem dúvida alguma, foi o fato de eu não conseguir mais adiar um sonho. Algo que parece que eu nasci para fazer. O incentivo foi aquela cosquinha dentro do peito.

É possível destacar uma poesia que mais se assemelha a seu cotidiano?

“acerta o sal”.

A sequência dos poemas conta alguma história?

Não. Eles não estão em ordem cronológica e se misturam em tema, essência e sentimento.

Existe algum posicionamento político ou cultural na obra?

Não. Apesar de acreditar que toda arte é política de alguma forma, seria extremamente prepotente da minha parte colocar o carapuça nessa seara. Acho que ainda é necessário um certo amadurecimento meu, enquanto artista, para me colocar nessa fundamental prateleira.

Qual a relevância dos personagens implícitos/explícitos da obra?

Não sei se essa pergunta se aplica.

Qual a poesia mais marcante desse livro?

Para mim, com certeza é a “é de júpiter”, citada na outra resposta.