Alessandra Martins nasceu em Duque de Caxias, no Rio de Janeiro, hoje vive entre Brasil e Estados Unidos. É pesquisadora, escritora, poeta, ativista social e autora do livro de poesia marginal Voa, Sankofa, Voa! (Chiado Books, 2021). É graduada em Letras e especialista em História e Cultura Afro-brasileira e Indígena, cursa pós-graduação em Literatura, Artes e Filosofia pela PUCRS e MBA em Marketing pela USP.
Jurema Preta
Na noite
a chuva regou
as folhas da umbaúba
que belamente cresceu
Ao amanhecer
alfazema
tomilho, funcho e alecrim
no jardim floresceu
Verde, vida, amor
As borboletas passeiam
O vento suspira
A abelha namora a flor
Ela nasceu no inverno
Intensa.
É de Osun – além de
amarela, também ama azul
Ar fresco, sombra, flores
ela sente que renova
ela sente que é ela
Radiante
Jurema Preta é o nome
dela
Ao falar
ao olhar
ao sorrir
onde ela chega
traz cores
beleza
faz o dia florir
Seu aroma é forte
cítrico
exala capim limão
ao caminhar todos
a olham
presença marcante
tem o mundo nas mãos
Ela brilha concomitante
com o sol no horizonte
o som do atabaque se
encontra com o seu
coração de poesia
pulsante
Tudo ecoa
São sons de vida
Ela desperta do sono
Em seu sonho se vê
sambando
Entre flores de
girassol
Toma banho de
arruda
E os aromas se
misturando
espalhando
a terra
contagiando
flores
folhas
energia
O chocalho agita no
morro
Ao subir a ladeira
chegando pede
agô e fala adupé!
Ela reverbera sua luz
Os irmãos
respondem axé!
Bicho solto
Espírito meu,
teu, nosso
Nasceu para
ser livre.
Não se deixe
aprisionar.
Não permita
grilhões nos
seus tornozelos,
nem correntes
nos seus pulsos.
Nada que te faça
parar.
Grades? Corte-as!
Fechaduras? Quebre-as!
Cordas? Arrebente-as!
Não permita que
te impeçam de ver
o infinito do céu.
Lute, mas também
Descanse.
Aproveite as
abundâncias da vida
Saboreie do néctar,
do mel.
Permita-se ser amado
e amar.
Viaje, dance, beije,
viva, voe, navegue.
Descubra o infinito
do céu, a imensidão
do mar.
Negra Soul
Eu sou a negra que
você olha
e acha que não
vai conseguir.
Eu sou a negra
que você
tentou diminuir.
Eu sou a negra
que você
xingou, bateu.
Eu sou a negra
que você
desmereceu.
Eu sou a negra
que você
não quis namorar,
muito menos se casar,
só comeu.
Eu sou a negra parada
no canto.
Eu sou a negra que
acorda e vai dormir aos
prantos.
Eu sou a negra que na
escola você apelidou,
que na vida você
engravidou e abandonou.
Eu sou a negra
que você
manipulou e que
no passado se odiou.
Eu sou a negra
que
você mata
e não dá em nada.
Eu sou a negra que
você diz ser moreninha,
mulata e parda.
Eu sou negra!
A mesma negra que
você passou a mão,
a mesma que você
enxerga
como produto, objeto,
exploração.
Eu sou a negra
que é negra. Que tem
consciência e orgulho
no peito.
Que é humana e
merece igualdade
e respeito.
Eu sou a negra que
honra seus ancestrais.
Que sobrevive e vive
conquistando seus
ideais.
Sou a negra que no
passado e no presente
lutou e luta por libertação.
Eu sou negra!
Sua lança não pode
mais me atingir.
Porque você querendo
ou não.
Eu existo e vou resistir.
Você tentou me calar,
mas minha história não seu
apagou.
Negra de corpo e alma.
Negra soul.