O limite dos seus sonhos jaz no nosso anonimato

Texto de Eduardo Frota



Os membros dos Jovens Pioneiros, um grupo de jovens do governo soviético, usam máscaras de gás como parte de um exercício de preparação para ataques na área de Leningrado, em 1937. — Viktor Bulla / Wikimedia Commons

O mundo acaba hoje – disse o profeta.

E aqui na Terra, em toda a superfície dessa rocha errante, os viventes desligaram seus aparelhos celulares pela primeira vez. Era um dia quente, excruciantemente quente. Com as palmas suadas, porém desocupadas, puderam todos estender a mão a quem ao lado estivesse. Para variar, deixamos para nos preocupar com tudo na última hora, no último suspiro. Não é possível que partiremos sem respostas. Não explicamos de onde viemos e nem para onde vamos. Se somos apenas uma ínfima peça integrante de um joguete preso à gravidade ou se somos uma ridícula raça fadada a mandar pelo opressivo e vasto espaço inúteis sondas e foguetes.

Vamos embora sem respostas? – insistiu um humano.

É estranho, injusto e até tacanho termos tentado com tanto afinco fazer contato com outras civilizações e acabarmos com o intento malogrado. Tudo, absolutamente tudo o que ouvimos foram ruídos, chiados e radiação de fundo. Buscamos fora do limite dos olhos, bem além dos nossos limítrofes sonhos, sociedades mais inteligentes. Obviamente, tão diferentes da gente, já que falhamos assombrosamente em usar a pouca capacidade que temos, na qualidade de mamíferos bípedes com encéfalo desenvolvido, de andar para frente. 

Nós enviamos sinais pedindo respostas – alegou um cientista.

Ele insistia, mas ninguém dava crédito, era o que parecia. A era das trevas fundou uma realidade brutal. Odiava-se a ciência, amava-se a onisciência episcopal. Tentamos via imagem, som, música, verso. Nada. Mas fizemos o melhor, decerto. 

Me dá um trocado? – pediu um mendigo.

Pobres e ricos, na hora do desfecho serão todos reduzidos a pó, em montes de cinzas da mesma cor. Serão varridos feito indigentes sem um pingo de cumplicidade, carisma ou amor. Para dizer a verdade, camaradas, mal conseguimos estabelecer uma conexão com nossos semelhantes, cujas diminutas diferenças jazem em microscópicas e reluzentes moléculas de ácido desoxirribonucleico.

E como vai ser?

O profeta provavelmente era o único que estava certo, como esteve em centenas de milhares de outras vezes. Até o cataclismo, seguiremos presos ao baile cósmico sem saber dançá-lo, pisando nos pés uns dos outros, burilando cinismo, sem perceber que a flecha do tempo segue adiante. 

O anonimato cósmico talvez seja uma saída digna. Podemos todos fechar os olhos.