Texto de Laura Limp
o que importa nesse momento não são as distâncias impostas. mas os afetos. se tem algo que nos une neste instante, ao redor de todo o planeta, é o amor.
do assassino ao juiz, do justo ao corrupto, do pobre ao rico. de norte a sul do país, de um hemisfério a outro do mundo. não importam as distâncias nem as fronteiras. a classe social, a idade, o gênero, a raça, a crença religiosa, a orientação sexual, o partido, o time de futebol, nem mesmo as línguas importam. todo mundo ama ou já amou alguém. todo mundo.
e é por causa do amor que o Bolsonaro vai cair. não por causa do ódio, dos desafetos e desavenças, das discordâncias políticas ou da crise econômica que se anuncia, mas porque os amores devem ser preservados. e serão.
essa, talvez, seja a única coisa realmente capaz de mudar o rumo da história, o futuro do planeta e das pessoas que nele habitam: o amor.
e quando algo (ou alguém) ameaça aqueles que amamos (e talvez, para muitos, só aí, só atingindo este limite da possibilidade do inominável) descobrimos, boquiabertos, que somos verdadeiramente capazes de compaixão e de empatia. de nos perceber como seres interligados. de compreender o que é viver em comunidade. de entender como nossas escolhas pessoais influenciam toda uma sociedade, todo um ecossistema. só aí somos capazes de nos colocar no lugar do outro, verdadeiramente. de ter a real dimensão de que É IMPOSSÍVEL SER FELIZ SOZINHO, como cantava Vinícius de Moraes.
diante da dura lição que só um vírus foi capaz de nos impor — e que nos ensina que o afastamento daqueles que amamos pode ser a única arma que, de fato, precisamos — percebemos que: ou está bom pra tod@s ou não está bom pra ninguém. como dizia Sartre: “O inferno são os outros”. acredito que a antítese também seja verdadeira. pelo menos, temos o potencial para que seja.
a grande queda deste patético homenzinho (e, quiçá, de todo um sistema que já dava sinais de colapso) se dará, ironicamente, através do amor. exatamente o contrário de tudo que ele e os seus pregavam, seja em nome do dinheiro que escraviza e aliena, seja em nome de uma fé inescrupulosa que cega e abusa de inocentes.
ninguém está imune ao amor. ninguém, nem mesmo ele. nem mesmo este pobre e patético homem. ainda que seja pela ausência de.
hoje, depois de ser tomada pela revolta (como tantos de nós) após discurso tão irresponsável, criminoso e que beira o desumano, me pego sentindo algo inédito por ele: pena.
imagino a dor que deva sentir um ser tão incapaz de entender e vivenciar o amor; alguém que, muito provavelmente foi privado deste sentimento ao longo da vida. que solidão atroz. que escuridão permanente. que morte dolorosa e lenta, ainda em vida, é a ausência de amor.
que triste fim (pra alguém com ego tão gigante) deve ser ter nas mãos o poder de fazer alguma diferença no mundo e dessa maneira, entrar pra história… e o desperdiçar. uma enorme “oferenda ao nada” como bem disse Nilton Bonder em “A alma imoral”.
encerro com um poema de Wislawa Szymborska chamado “Vietnã”. ele, por si só, resume tudo o que eu disse antes. e que nunca mais nos esqueçamos do poder e da importância da arte, essa chama capaz de nos iluminar em meio a escuridão.
VIETNÃ
Mulher, como você se chama?
– Não sei.
Quando você nasceu, de onde você vem?
– Não sei.
Para que cavou uma toca na terra?
– Não sei.
Desde quanto está aqui escondida?
– Não sei.
Por que mordeu o meu dedo anular?
– Não sei.
Não sabe que não vamos te fazer nenhum mal?
– Não sei.
De que lado você está?
– Não sei.
É a guerra, você tem que escolher.
– Não sei.
Esses são teus filhos?
– São.