Texto de Fábio Fernandes
O primeiro porre a gente não esquece.
Você quase esqueceu. Cadê neurônio depois de tanto álcool na cabeça? A única lembrança que ainda lhe resta daquela noite foi o salto: apostou – dizem que foi a dinheiro, mas isso você faz questão de não lembrar – com os amigos na festa para ver quanto tempo cada um levaria para tocar o chão, pulando do alto da janela do segundo andar da casa.
Você também não lembra que foi o único, que todo mundo riu da sua cara, que você estava tão bêbado que não sabia. Você tinha dezesseis anos e achava que sabia de tudo. Achava inclusive que conseguiria retardar o salto em pleno ar e descer suavemente, como uma pluma, um saco de plástico.
Você ainda não havia estudado fenomenologia da percepção e outros babados, a noção de tempo interno do observador, etcétera, etcétera. Foi por isso que o salto durou para sempre, sua besta.
Mais tarde, você seria levado ao hospital com fratura múltipla no braço esquerdo e na clavícula, mas o médico, que se chamava Newton (isso você não vai esquecer tão cedo) examinaria as chapas de raios-x e diria simplesmente: não houve gravidade. Você acha que ele estava tirando um sarro da sua cara.