Crônicas do retorno: a poesia de Vanessa Vieira Gomes

Mais uma poeta chegando na Kuruma’tá. Nos alegra demais esses encontros, que vão surgindo espontaneamente, da vontade de quem reconhece na revista um espaço aberto, um território carinhoso com quem o adentra e faz daqui seu lugar.

Vanessa Vieira Gomes traz pra gente três belos poemas de seu livro Crônicas do retorno, que está em pré-venda no site da Editora Folheando.

E você que tá aí se encantando com a poesia de Vanessa, clique no link e reserva seu exemplar, né?! Vamos valorizar, comprar, compartilhar a nova poesia, que tá sendo escrita por esse brasil adentro, resistindo a tudo.

Dos autos

Existe algo interessante
Sobre declarações de amor
Elas são feitas ao tempo
Se trancam ao momento
Numa fragilidade íntima
Que só a ampulheta
Consegue simular
Como gotas de chuva
Se esvaindo pelo presente
Imortalizando o momento
Se emancipando da gente


Escrever

Escrever é dilúvio
Que desagua dos terrenos
Hostis das nossas mentes

Escrever é se reconhecer
No espelho da temporalidade
Do tique-taque que nos
Consome da rotina adulta

Escrever é corrida desenfreada,
Busca por vocábulos escondidos
Flagrantes de rascunhos,
Julgamento em preto e branco

E escrever é descanso
Dos agouros da vida terrena
É leveza que
Se preenche
Se exata por si

Escrever é respiro
Depois de um tiro
É suspiro, é acalento
Quente e enfeitiçado
É verbo e substantivo
É sensação e leveza

Escrever é tecer
Caminhos e pontes
Entre o real e imaginário
É convencer opositores
Amalgamar continentes
Escrever é traduzir línguas
Transmutar em sintonias

Escrever é dar corpo
A esse turbilhão incerto
É gestação de nove meses
É contração
É anseio em cada linha
Até ser contingente


Impermanência

Contraditórias és tu
Impermanência que
Por onde passa e toca
Nos obriga se contentar
Com a ironia da semântica dos prefixos

Cético que sou
Permaneço na vontade e no desconhecido
De estender no desejo por mais de sua polissemia

Contraditórias és tu (impermanência)
Exprime no âmago
Lições de uma vida
E nos debruça por mais joelho
Quando somos mais colo

Contraditória és tu (impermanência)
Por brincar de ser intransitiva
Desprezar complementos
Nessa sintaxe que nos convida
A conjugar transformação


Zeitgeist

Nossos avós falam das guerras,
Da fome, da pobreza;

Nossos pais falam das crises e dos pós-guerras,

Nós falamos dos egos.


Crônicas do retorno é resultado de idas e vindas da autora no âmbito da escrita. Em contato com a literatura desde os 14 anos (blogs sobre música na era otimista da internet) e em pausa desde os 24. Crônicas porque é vivência diária, tempo que marca, matéria-prima para escrever, para pensar, rebobinar, digerir e, por fim, colocar para o papel o que está guardado e pode se corporificar nos escritos. Retorno porque é a volta à escrita após sete anos.

Nascida no final da década de 1980 no Rio de Janeiro, Vanessa Vieira é bacharel em Comunicação com ênfase em Linguística e Estudos em Quadrinhos. Em um breve período, foi estagiária de fotografia e, em seguida, trabalhou no ramo editorial com obras de especialização em informática.


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