MONÓLOGO
Sempre me vi errada, me vi distorcida. Não sabia me carregar, nem andar, nem falar, nem vestir. Era um corpo grande demais para a minha alma. Desconfortável! Escondia-me por detrás da minha cara fechada, e nas possibilidades que a solidão me oferecia.
Levei muito tempo até começar a me ver, demorei muito a crescer. E doeu, mas reconheci-me!
Traduzi para prazer todo o amor que queria me dar, todo amor que eu gostaria de receber, entreguei a mim mesma numa bandeja de ouro e curvei-me aos pés da rainha que de mim agora nascia.
Demorei um pouco até ver quem realmente sou, hoje aceito e mais do que tudo respeito.
Quero dar a mim a paz que ofereci ao mundo, a paz que por muito tempo desejei mais do que tudo.
Não quero precisar de caber em lado nenhum. Não quero fazer parte de nada que não entre em comunhão com a minha alma. Mas digo isso no verdadeiro sentido da palavra. O que for para mim que seja como o que a chuva e para a terra, ou que o sol e para os humanos.
MONOLOGO II
Não se diminua para caber
Se estiver a ser sincera a maior parte do tempo aqui nesse plano eu passei a tentar encaixar, a tentar caber. Mas para isso eu tive de me diminuir, tive de ir cortando pedaços de mim, parte essenciais até que finalmente eu própria não mais me reconheci. Eu tive de ir largando, largando, até que finalmente o que tanta força eu tentei segurar largou-me também, por não me reconhecer, por não me sentir mais.
Não havia calor em mim, o que me guiava era indesejoso intenso de ser aceite. “ agora sim “ essas palavras acendiam luzes em mim, em quartos que eu não sabia que existiam.
Perdi de vista a mulher que sempre quis ser, decepcionei a criança que fui, e no final já nao sabia para onde ir, para quem olhar, como ser e nao sentir desconforto. Perdi a certeza de tudo, perdi a clareza sobre tudo, perdi a minha bússola. Desorientada, atirei para todos os lados, com medo do escuro, botei gasolina em mim mesma na esperança de ver, ainda que por segundos, o caminho a frente com um pouco mais de clareza.
A poeta e escritora angolana Maria Chimbili, conhecida como Nakamela, nasceu no Huambo em 1994. Formada em ciências sociais, a escritora analisa a “cura” como mudança social, pois acredita que o autoconhecimento seja uma das formas de alcançá-la, impulsionando o desenvolvimento pessoal e profissional de cada cidadão.
“Gosto de acreditar que a minha escrita funciona como uma maquina do tempo que leva as pessoas para o passado e para o futuro, aquecendo sentimentos que se encontravam frios e acendendo luzes em quartos esquecidos. Desejo escrever livros que sirvam como arma contra sentimentos que matam.”