Texto de Toinho Castro
Que pode haver de maior ou menor que um toque?
Walt Whitman
Li numa entrevista da Claudia Schroeder que os poemas que compõem seu livro As partes nuas, lançado em maio passado, foram escritos nos últimos quatro anos, sem intenção prévia de formarem um livro. Isso muito me impressiona, dada a coerência e fluidez das páginas que ando lendo e relendo nesses dias.
As partes nuas é um livro muito bonito. É tentador associar a ele todas essas palavras que nos surgem no pensamento quando se trata de poesia… lirismo, ternura e afins. Quero evitá-las.
As páginas que Claudia Schroeder alinhou no seu livro são finamente costuradas. Tudo faz sentido e somos levados de poema a poema com naturalidade. É quase um romance em versos. Estamos acostumados à ideia do romance enquanto prosa, enquanto fatos encadeados. Mas esse pequeno livro, leio como a história de uma mulher. Não há linearidade porque todos os caminhos se cruzam. As percepções estão enlinhadas e o corpo, o corpo da poeta, e da poesia, não é sólido.
Essa relação ‘poesia / corpo’…. acabei por encontrá-la na primeira frase da apresentação do livro, escrita pelo poeta português, a quem muito admiro, José Luís Peixoto. “Os poemas são corpos”, diz ele. Costumo deixar as apresentações e prefácios para o final, e com esse livro não foi diferente. Encontrar essa frase reforçou meu sentimento do poder físico desse livro, que me acompanhou toda a leitura.
Sim, são poemas do corpo. Ou corporais, o que não exclui a alma. Corpo da mulher, da poeta, mas também do leitor, marcado pelas suas próprias experiências; pela própria sexualidade e memória. Memória do corpo.
Que esse livro, As parte nuas, tenha sido publicado agora, em meio à pandemia, à ruptura dos distanciamentos, das máscaras e da assepsia, é de enorme precisão. Uma leitura que cai certeira, a nos recuperar como gente. Dores, prazeres, amores, cheiros, a velhice, a pele, o sexo, as bocas, os medos. Lista infinda do que é uma criatura no mundo. Eu não conhecia o trabalho de Claudia. Alegro-me em conhecê-lo aqui e agora.
Escrevo e o livro está aqui ao meu lado. Lá no começo disse que As partes nuas, era um livro bonito. Isso vale também para o objeto físico. Uma bela edição da querida e histórica Francisco Alves. É uma arte gráfica que me surpreendeu. O formato, o projeto/diagramação, a arte de José Bechara tão bem trabalhada em todo o contexto de livro. A vontade física de tocá-lo, segurá-lo.
As partes nuas evoca nossa existência, tecida de encontros e toques, desfiada pelo corpo e pela alma, essa testemunha do corpo.