Inbox Kuruma’tá bombando de poesia! Hoje é dia de Giselly Corrêa, paraense que mora no Ceará. Estudante de jornalismo, aos 21 anos de idade e de sonho, Giselly abriu caminho até a gente e enviou dois poemas, que publicamos com essa alegria de missão cumprida, de chegar nesses Brasis todos, nesse Ceará querido e poético, de tantas vozes incríveis. Seja bem-vinda, Giselly! Portas da Kuruma’tá sempre abertas!
conheci Jesus, minha senhora
é uma mãe preta
uma avó cozinheira,
uma professora, uma artista,
uma faxineira
no meio de nós
bateram à porta, atendi
eram as irmãs da igreja
e suas saias tão longas
quanto seus cabelos
“minha filha, você aceita jesus?”
e ele mandou solicitação?
repreende senhor, diz a senhora
todo domingo
é dia de evangelizar
levar aos perdidos
como eu
o Deus, sua propriedade
o homem branco, o salvador
criador dos céus e da terra, redentor
logo esse Deus, tão diferente de mim
Mulher, trans, LGBTQI
além de tudo
pecadora
e sem um tostão pra contribuir
Que Deus vai me querer assim?
quando refleti me despedi
já conheço Deus e seu filho Jesus
pega ônibus comigo, pediu ajuda pra mim
tá na rua, pedindo socorro
implorando aos próprios filhos
piedade
amai-vos uns aos outros
não é assim que vos ensinei?
conheci Jesus, minha senhora
é uma mãe preta
uma avó cozinheira,
uma professora, uma artista,
uma faxineira
e também a vagabunda
que vocês julgam, apedrejam, perseguem
e todo vez que escuto
Deus acima de tudo
estremeço
mas elas não foram embora
sem antes dizer
“deus esteja convosco”
em um reflexo respondi:
“Ele está no meio de nós”
Brasil, 2022
Todo dia tento ser otimista
Quando sol interrompe meus sonhos
acordo e penso
“dia lindo, dia de ser otimista”
Coloco pra dentro um café sem pão,
Ligo a tevê,
Desgraça, fome, trapaça, destruição
Desligo. É dia de ser otimista
feliz, o vizinho me diz
que o auxílio vai chegar
a gasolina baixar e o povo se armar
daí atravesso a rua
e um irmão me pede:
água, dinheiro, comida, emprego
Dou um tostão, é tudo que tenho, perdão
Subo no busão, passagem aumentou
vou caminhando trabalhar
em risco a vida, a carteira,
e a alegria de voltar
mas tento ser otimista.
oito horas me esperam,
berros do chefe,
trabalho duro
e o salário compensa?
mil-duzentos-e-doze
mal dá pra merenda,
pra parte da igreja, pro quilo da calabresa
ainda sim
tento ser otimista
porque se minha mãe dizia
filho, deus proverá
ser otimista não é mais uma escolha
é a única forma de continuar
Versos de uma tarde de sábado, de trabalho,
a 15 dias da eleição
apesar de tudo, o otimismo
Giselly Corrêa Barata é paraense radicada no Ceará, 21 anos, estudante de jornalismo que vez ou outra se aventura na ficção.