Eu não posso deixar de me esquecer de mim Revista Kuruma'tá, 19 de fevereiro de 202119 de fevereiro de 2021 Texto de Eduardo Frota Lembro quando a vida tinha trilha sonora – ele pensou, o trompetista do circo, querendo esquecer o que tocava, o que dizia. Cada nota, cada sopro, tudo em seu devido lugar. O som, o seu som. Todos os sons que cabiam no mundo. Até o som que o sol fazia quando batia no seu rosto e que me deixava mudo. Lembro quando para cada dia havia uma sinfonia – você lembra também, bailarina? Para cada sonho, um solfejo. Barulhentos eram os pesadelos quando a música ficava longe, guardada como lembrança debaixo do travesseiro. Lembro quando as colcheias e as palavras começaram a parecer fora de compasso – quem nunca… Nem poesia, nem afago, nem abraço. Nenhuma letra, nenhuma rima, nada dando conta de explicar ou abarcar o espetáculo da trilha da vida. Eu tocaria só pra ver você dançar uma marchinha. Esquece. Onde está minha surdina? LEIA outros contos de Eduardo Frota A Contoprosa