Texto de Fábio Fernandes
Deitada em sua cama, a múmia observa. Apenas observa: há muito não faz outra coisa.
Seu único consolo é que ninguém sabe o que ela pensa. Às vezes nem ela própria. Basta-lhe ouvir as pessoas entrando e saindo do seu quarto, o chocalhar dos vidros de remédio e o pingar incessante do soro ao lado da cama. Às vezes a múmia pensa que pode ouvir as próprias rugas se formando na pele encarquilhada. Como anéis e marcas em troncos de árvores. A múmia acha que leu alguma coisa a respeito em algum lugar. Mas já faz muito tempo.
Ninguém sabe quantos anos a Múmia tem. Nem ela mesma.
Deitada em sua cama, como se embalsamada fosse, a múmia espera sua hora.