Hoje trazemos uma colaboração do amigo Joelson Pranto, comentando esse clássico absoluto de Júlio Verne, Viagem ao centro da Terra. Alguns dirão que não há novidade alguma nesse livro… E certamente é um livro sobre o qual muito já se disse e a edição comentada nem é mesmo uma novidade também. Ainda assim é sempre bom lembrar de livros assim. Até porque é uma obra que está naquela classe de livros que são tão enraizados na cultura que muita gente acha que leu sem ter lido. Aproveite que essa edição ainda pode ser encontrada nas livrarias. Se já leu, leia novamente. Leia com seus filhos.
Joelson, apesar do sobrenome, é um cara feliz.
Texto de Joelson Pranto
A história de Viagem ao centro da Terra, segundo romance de Júlio Verne, todos conhecem… Em 1863 o professor e cientista alemão Otto Lidenbrock encontra um manuscrito de Arne Saknussemm, um alquimista islandês do século XVI, que uma vez decifrado aponta o caminho rumo ao centro da Terra, cuja entrada estaria na boca do vulcão Sneffels, na Islândia. O impetuoso e destemido professor arrasta a si e seu sobrinho Axel , narrador da aventura, da Alemanha até a terra gelada de Saknussemm. Lá, guiados por Hans, um guia local, eles adentram as entranhas do planeta e começam uma aventura de tirar o fôlego! Na verdade, Júlio Verne se certifica de criar uma história emocionante desde as primeiras páginas, em que um acontecimento grandioso, de ordem histórica, vai desabando sobre seus personagens e os empurrando sempre adiante, sempre de súbito, movidos pelo professor Lidenbrock, com sua irritação, sua urgência em realizar o nunca feito, ou melhor, alcançado por um único e lendário homem, Saknussemm.
Mas que move o professor Lidenbrock não é a aventura, mas a ciência. A cada passo da jornada a ciência do século 19, ansiando pelo século 20, nos desafia e provoca. Não há espaço para malabarismos místicos ou metafísicos. Lidenbrock navega num mundo onde reinam as evidências. Tudo tem uma explicação. E se essa explicação se mostrar insuficiente, outra tomará o seu lugar. Entre as provisões que carregam não faltam instrumentos de medição que possam asseverar os dados, confirmar ou refutar hipóteses.
Eu lendo a ótima edição da coleção Clássicos da Zahar, um belo exemplar de capa dura, recheado com as ilustrações que Édouard Riou criou para a edição de 1867 e com muitas notas de rodapé, que explicam, contextualizam e atualizam informações; um conteúdo precioso para a leitura contemporânea da obra.
Tem uma cena do livro em que o Lidenbrock e Axel estão em Copenhague, a caminho do destino enorme, e o professor leva o sobrinho para visitar uma pequena igreja e o faz subir ao alto do campanário, por uma vertiginosa escarada em espiral. Para descer às profundezas Axel deverá primeiro subir às alturas, porque em ambas reside a vertigem, do mundo, da vida. A torre se erguia na noite, acima da cidade, e as nuvens deslizavam logo acima de suas cabeças. É um momento lindo do livro. Logo estarão no topo do Sneffels, outro jogo lindo de ideias.. Subir ao alto de um vulcão para poder descer ao mais fundo, rumo ao núcleo. Verne poderia tê-los feito descer por tantas cavernas, mas os enviou para a violência adormecida de um vulcão, numa ilha fria e distante, tal era o seu senso de aventura e de diversidade científica para explorar. Que livro maravilhoso. Não é à toa que foi editado, em 1864, como parte da série Les voyages extraordinaires, que reunia 54 novelas de Verne, entre elas Cinco semanas num balão e Vinte mil léguas submarinas.
É um livro mágico. Abrir suas páginas é abrir a porta de um mundo labiríntico. Os subterrâneos do professor Lidenbrock parecem nos ensinar que a Terra é como a Tardis, a nave do Doctor Who: Maior por dentro que por fora. Quando pensamos que eles estarão sufocados, entranhados, esmagados sob o peso dos continentes e mares, descobrimos vastas paisagens e camadas e mais camadas de passados possíveis, como se rumássemos, ao mesmo tempo, ao infinitesimal. O mundo dentro do mundo dentro do mundo. Essa é a beleza de Viagem ao centro da Terra… Mesmo que nossa jornada seja para dentro, o que nos espera é sempre o infinito.
Em tempos de negação da ciência livros como esse são um lenitivo, mesmo com os anacronismo, que são devidamente tratados pelas notas que acompanham a narrativa. por isso ler Júlio Verne é tão legal e importante, junto com outros livros atuais que trazem a ciência em primeiro plano. Vamos falar de ciência, gente!
No mais, as edições atuais do escritor francês utilizam a grafia Jules Vernes, mas eu mantenho o meu Júlio Verne, que trago desde a infância, quando li pela primeira vez essas páginas de paixão e aventura.
Muito legal