Como num passe de mágica eu posso partir

Texto de Eduardo Frota


Há quem diga que foi um truque malogrado. Outros, que foi tudo, do gesto inicial ao resultado, premeditado. Quem vai poder contar o que realmente se passava pela cabeça do mágico? Recusou fazer o número principal, aquele que arrancava um suspiro exasperado do respeitável público que se amontoava na praça: o desaparecimento a olhos nus. Havia o artista da ilusão perdido a graça?

Pediu a sua bela ajudante que trocasse de lugar com ele. Entraria na pequena câmara que, posteriormente, seria fatiada em dois pedaços bem ali na linha da cintura. A moça retrucou, gritou: loucura, isso é loucura! Mas nada do que ela falasse demovia a ideia de que o número de encerramento seria assim, daquele jeito. E assim foi feito.

Sob olhares atônitos, o mágico retirou da cabeça a cartola, arrumou o paletó num gesto meio angustiante, apontou o serrote prateado para a ajudante e deitou-se na posição que era esperada. Mais tarde naquela noite, depois do ocorrido, a bela moça confessou que viu uma lágrima escorrer feito a jusante de um rio – daqueles inomináveis.

Há quem diga que ele não suportava mais segurar a vontade de usar as pernas para percorrer um caminho.

Há quem diga que, na verdade, fez da arte a vida porque se sentia assim mesmo, dividido.

Saiu de cena de duas formas que não esperava. A saber, aplaudido. A valer, aturdido.

Foto: Getty Images – Brian Johnston broadcasts on the BBC’s Home Service in 1949 while sawing

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