O sol descalço de Carlos Cardoso Revista Kuruma'tá, 22 de julho de 20219 de agosto de 2021 Texto de Toinho Castro Mais um livro de poemas de Carlos Cardoso me chega Às mãos. Sol descalço (Editora Record), lançado nesse ano de 2021, é mais um sopro, mais um alento, em meio à confusão, ansiedade e tristeza que se vive num Brasil devastado pelas perdas contínuas da pandemia. O livro é um breve volume, com 71 páginas, de uma poesia que aprendi a apreciar desde seu primeiro livro que li, Melancolia, de 2019, premiado como melhor livro de poesia de 2019 da APCA – Associação Paulista de Críticos de Arte. Mas não olho pra prêmios… eu olho para a poesia. Para o poeta. Leio na primeira linha da apresentação de Italo Moriconi, que este é um livro que chega em boa hora. Não poderia concordar mais. Sou avesso a ler prefácios e afins, mas diante do nome de Italo Moriconi, cedi. O que mais eu poderia dizer sobre esse livro, que fosse além da delicadeza e precisão das palavras do Italo?! Muito bem recomendado, é um livro que chega ainda com uma orelha escrita por Marco Lucchesi. Cabe a mim então, modesto leitor num apartamento em Vila Isabel, dizer que reencontrar ao trabalho do Carlos Cardoso nesse livro, é um prazer literário, raro. Navego de poema a poema, página a página, com naturalidade, pois essa poesia, não porque seja fácil, mas justamente pelo desafio de um trabalho elaborado, que cria uma tessitura de palavras, que vão se sucedendo, puxando o fio de significados inesperados ao longo dos poemas. Vou lendo e me surpreendendo. Vou lendo e despertando para as imagens que são como construções surrealistas, pela associação do inesperado a cada verso. Muito gratificante a leitura de Sol descalço, para quem quer que ame a poesia e busque pela linguagem madura, depurada, trabalhada com delicadeza e ao mesmo tempo ousadia. E o que eu gosto é que há uma musicalidade nesse livro, que abre com um chamado altivo… “Que caia o amanhecer”, para depois trazer uma canção. Brincando alinha os versos Talvez as palavras me fujame eu me disfarce de poeta,o silencio é minha casae a construo em linha reta.Talvez as palavras me fujame eu me disfarce, cortejante,o silêncio é uma pedrae a chamo diamante.Talvez as palavras me fujame eu me disfarce de criança,o silêncio é meu pecado,e meu verso, a esperança.Talvez as palavras me fujame eu me disfarce, assim, amando,o silêncio é minha artee o criei assim, brincando. uma beleza que vai se confirmando a cada poema. Li também na apresentação que alguns poemas seriam da primeira lavra do poeta, dos temos de sua adolescência mesmo, o que torna o livro ainda mais precioso e instigante, nos permitindo traçar o percurso do poeta, que talvez seja, ele mesmo, um sol descalço em sua trajetória ou liturgia. Felicidade grande esse livro nas mãos. Prezo demais a força poética de Cardoso. Muitas vezes não entendo o que estou lendo mas sou carregado, não pelo significado possível, mas pelas cadências, pela suspeita permanente do algo mais, do algo além, pela certeza de sua ligação íntima com o mais humano em nós. A Carlos CardosoPoesia