Outra dimensão: O disco da minha amiga Marina Lutfi Revista Kuruma'tá, 23 de agosto de 202125 de agosto de 2021 Texto de Toinho Castro Não vou escrever sobre esse disco, Outra dimensão, fazendo de conta de não conheço Marina. E a história peculiar desse encontro, desse conhecimento, é literalmente coisa de cinema. Em certo sentido, é também musical, porque se deu por conta de uma música, Bichos da noite, escrita pelo seu pai, Sérgio Ricardo, sobre poesia do pernambucano Joaquim Cardozo, no seu livro O Coronel de Macambira: bumba meu boi, em dois quadros, de 1963, e o filme Bacurau, de Kleber Mendonça Filho. Mas essa história, por demais contada, eu relembro de outra feita, pra não perder o rumo dessa prosa. Basta dizer que eu e Marina nos conhecemos por meio de um amigo em comum, o Christiano Calvet, que nos colocou em contato. Estávamos eu e o Chris na Adega Pérola, celebrando nosso reencontro, depois de muito tempo, e comentamos a tal história que envolve Sérgio Ricardo, Bichos da noite e Bacurau. E ele emendou: Você precisa falar com Marina! Pegou o telefone e ligou pra ela, ali mesmo, na muvuca do bar, entre sardinhas e chopes. E tudo isso é pra dizer que a primeira presença de Marina na minha vida, foi a voz. Eventualmente a gente se encontrou pessoalmente, trocamos ideias, papos, e consolidamos uma amizade maravilhosa. Nesse meio tempo veio a pandemia, eu lancei livro, seu Sergio, pai de Marina, nos deixou e deixou esse buraco na música brasileira. Marina botou pra frente e pra cima, com muita bravura, o projeto Sérgio Ricardo Memória Viva, dando norte e sentido à vasta obra do pai… e lançou um disco. Primeiro um single, Barravento, no aniversário de um ano da morte do pai. Auspicioso. Vibrei! Ela e o irmão, João (Gurgel) mandaram ver, com duas interpretações singulares de músicas de SR. Mas não era só isso, não que fosse pouco, e agora Marina Lutfi solta seu discaço nas redes, pra todo mundo ouvir. Outra dimensão é um disco da felicidade. É o disco de um país que vai escapando pela tangente, da Covid, dos desmandos de um governo violento e autoritário. É um disco da beleza, do encantamento e do encontro. Com três músicas de Sérgio Ricardo, Barravento, Cacumbu e Esse mundo é meu, sendo essa terceira uma parceria com Ruy Guerra, o disco presta tributo a esses dois, em que se mistura cinema e música, na narrativa de um Brasil destemido. E ainda tem Julio Dain abrindo a audição com a música título e No meio da escuridão, Arnaldo Antunes e Perícles Cavalcanti com Quase tudo, Rodrigo Maranhão, com merecido Grammy Latino por Caminho das águas, em 2006, entra com sua Milonga, e essa dupla constelar, João Donato e Pàulo César Pinheiro, com Ahie, gravado por Donato no seu disco Quem é quem, de 1973. Eu podia parar aqui, porque já deu a dimensão imensa, luminosa, de Outra dimensão. Mas tem um povo ali, num instrumental sinuoso, ousado, límpido e um monte de adjetivo que eu, enquanto escuto besta o disco, poderia enumerar. É gente que gosta de música, que gosta de enveredar pela música, feito floresta. Instrumentistas de primeira grandeza, e a gente pode sentir o quanto estão à vontade nos arranjos, o quanto tudo é uma construção muito rica, em que cada um bota o melhor de si na maior alegria. Daí o equilíbrio, de uma música que conduz à outra naturalmente, sem desvios ou desvãos, sem hesitações. Porque o disco conta essa história, uma história contra o desânimo, a descrença. Contra a maldade. E ligando tudo isso, o tecido da voz bonita de Marina. A mesma voz que ouvi naquele telefonema em que nos conhecemos, lá em maio de 2019, quando ninguém imaginava o tanto que ainda ia acontecer no mundo. E desse tanto que aconteceu, deu-se Outra dimensão, um disco para um Brasil muito melhor! Não é porque sou seu amigo não, Marina… mas que disco danado de bom! ESCUTE NAS PLATAFORMAS! Uma possível contracapa se o disco fosse o LP que a gente adoraria que fosse! Direção e produção musical: Flávio Mendes Produção executiva: Marina Lutfi Assistente de produção: Paula Marques Arranjos: Flávio Mendes e Henrique BandMúsicos: Flávio Mendes, João Gurgel, Henrique Band, Marcelo Caldi, Alexandre Caldi, Guto Wirtti, Carlos Cesar, Carlos Pontual, Lui Coimbra, Domenico Lancelotti, Marcos Suzano, Levi Chaves, Diogo Gomes e Everson Moraes.Coro e palmas: Isabela Ciavatta, Rosa Ciavatta, Daniela Nunes e Lucas CiavattaParticipação especial: Sérgio Ricardo Gravação:David Brinkworth no Studio Aurea, em julho de 2015 e no Sambatown Estúdio em agosto de 2015.Rodrigo Ramalho no Plaza Hi-Fi Estúdio em janeiro de 2017. Carlos Fuchs no estúdio Tenda da Raposa em agosto de 2017 e julho de 2018. Todos no Rio de Janeiro.Mixado e masterizado por Carlos Fuchs no estúdio Sá da Bandeira, em julho de 2021, no Porto, Portugal. Capa: Foto: Michel Schettert Design: Marina LutfiRealização: Cacumbu Distribuição: Nikita Music DigitalAssessoria de imprensa: Belmira Comunicação A DiscoDiscotecaMarina LutfiMúsicaMúsica BrasileiraSérgio Ricardo