Poemas de ‘Entre um eco e outro’, de Angelita Guesser Revista Kuruma'tá, 10 de julho de 20208 de março de 2021 Angelita Guesser chega com sua poética à Revista Kuruma’tá, com quatro poemas do seu livro Entre um eco e outro, que em pré-venda na Editora Letramento, e também um poema inédito, na voz da poeta. A poesia é sempre bem-vinda na nossa revista, ainda mais assim, com esse timbre, essa fibra. Entre um eco e outro há o que? Aparentemente o silêncio, mas também uma expectativa, se aquilo que dissemos vai perdurar, ecoando indefinidamente. Entre um eco e outro, poesia. Toinho Castro (Editor) #sofá_prateado a vida é só vida, mesmono lugar mais íntimo do mundono teu largo sorrisono nó das ideiasa vida ainda é só vida e quanto mais busco vidapercebo sem cair em amora morte vestida de luz opacaa nudez do descaso ea conclusão de que escreveré um ato relutantede que a vida é só vida percebo em instantes tão pequenosmesmo que cante a própria músicano infinito da noite sem limiteno sol que nasce sabe-sepor qual caminhoque a vida é só vida e assim enquanto o loirinhose esconde na borda do sofá prateadoe inspira esse momentopercebo lá no fundoque a minha vida é feita de vida #palavras carregue-me em teu corpotatuada feito paixão.essa pele toda que contornae abraça cada molécula tua, sou eu.carregue-me em teu corpo,tatuada feito mapa quesegue as curvas em estrada reta.curvas inesperadas, que oscilamfeito respiração que busca redenção.carregue-me em teu peito,feito canção esquecida.feito certeza que não falha.fica em mim, assim comoos pedaços que remontammeu atordoado coração. #paisagem percebo através do vidroabafado pelo vapor da chuvaos telhados verdesdos musgos que se formaramatravés do tempo, dos diasque sem piedadecorromperam sua beleza. no escuro da tarde de outonoformou um horizontede tristezas e lamentosque aos poucos abraçaramo pobre coração solitário. por dentre as estruturascircundantesque furtaram da almaos privilégios da liberdade, escreve-se a trajetóriaque começou com a chuva. trajetória de resgatede um tempo ondeos telhados ainda brilhavamcom os primeiros raios de sole serviam de espelhospara os sonhosdaquelas que apenasconfiavam na belezade uma vida quereverenciava um simplesamanhecer. #mesmo_nome dei-te a vida em meu ventre,e foi para que visse o meu mundo,e assim te fiz amor. dei-te asas em meu sonhopara que pudesse desvendaro infinito da dor,e conseguissetocar a última gotado orvalho no amanhecercintilante de uma escura noite. dei-te o amor,e desfolhei cuidadosamenteas dobras do tempopara que fugisse dailusão da perfeição. dei-te minha vidapara donos sermosda nossa própria obrade silêncio, perplexo, e ali ficamos, cegosà procura da escuridãotraçada por nossos enganos,amando apenasas duras linhasde uma vida semperdão. “Adquiri o hábito da escrita através da transcrição das sessões de psicoterapia em que trabalho por mais de 18 anos. Desenvolvo meu lado artístico através das palavras e dos desenhos.” Poema inédito ELA Os barulhos que estão em mim, não são meus, são da noite. Um inseto que anda e respira aqui dentro. O arrastar do chinelo na biblioteca, esse barulho é dela e está em todo lugar. O movimento das asas de cada mar que carrega o grito de lamento, sobretudo, o barulho aqui dentro, não são meus, são dela. O eco do pregar do martelo, e ainda, o arrancar do parafuso que segura o sossego lá dentro da madeira. Ah! esses também não são meus, são dela. O vidro que ofusca a claridade das raspas de gelo, me abre e rasga a carne. O que dói primeiro? Amar sem amar ou nunca amar? O rugido dos leões, o pedalar da bicicleta na areia movediça, ou dedicar a vida inteira em rezas para que o corpo tome fôlego e sobreviva ao frio dos teus olhos, esses barulhos atordoantes, certamente são dela e não meus. Qual é o barulho da certeza que não vale um poema? Os pensamentos já velhos, revestem o instante, e a diferença entre vigiar e passar os dias olhando, se esvai junto com ela. Quero sentir o silêncio entre estrondos, ser refém que não espera resgate. Quero sentir o vento que carrega as folhas no outono, e desprende da noite o barulho da solidão, que refletida pela lua, é o leito que sempre volta. A Angelita GuesserLeituraLivroPoesia